Bolsonaro declara guerra contra a vida dos brasileiros


O pronunciamento de Bolsonaro deve entrar para a história como o momento em que o presidente do Brasil declarou guerra contra o seu próprio povo. Se aplicada a política proposta por ele, de fim do isolamento social e retomada de toda a atividade econômica de forma normal, em poucas semanas provavelmente estaremos assistindo nos leitos e nas portas dos hospitais, UPA’s e UBS’s, nas casas, becos e vielas do país, a uma verdadeira carnificina, com dezenas, centenas de milhares de mortos, talvez milhões, em sua grande maioria negros e negras, que formam 80% dos usuários do SUS. Um colapso dessa magnitude, no entanto, não pouparia os 25% de brasileiros que têm acesso aos planos de saúde, pois tampouco há leitos disponíveis para tratamento intensivo na rede privada caso a curva de expansão do vírus não seja achatada a tempo.
Eles, a extrema-direita e os neofascistas, agem de forma consciente e deliberada para naturalizar a morte dos supostamente “indesejáveis”. Esse lugar é ocupado por negros e negras, no Brasil e países da diáspora negra, pelos LGBTQI+ em todo o mundo, pelos imigrantes nos Estados Unidos, pelos refugiados na Europa, e nesse momento mesmo os idosos. Querem convencer a população de que algumas ou milhões de vidas não importam, são descartáveis, não podem estar à frente da “saúde econômica”, termo usado no editorial do The Wall Street Jornal, porta voz do principal mercado de capitais do mundo.
Bolsonaro reproduz ao mesmo tempo discurso idêntico ao de Trump, dos donos da Havan, Madero, Giraffas, Roberto Justus, ou seja, a de todos que neste momento estão afirmando abertamente serem indiferentes às mortes provocadas pelo Covid-19, como se a expansão do novo e perigoso vírus, cuja humanidade não tem anticorpos, por si só, já não fosse suficiente para provocar além de milhões de mortes um estrago provavelmente sem precedentes na economia capitalista mundial. Na verdade, já é isso que está ocorrendo, ainda que estejamos longe de saber o alcance e o tamanho da tragédia.
A principal tarefa em defesa da vida nesse momento é impedir que Bolsonaro aplique a sua política e reverta as medidas de isolamento social.
Para que tenhamos forças, é de fundamental importância que as exigências de estabilidade no emprego, renda mínima e revogação do teto de gastos para investimento pesado na saúde pública ganhe força social e pressione os governadores e prefeitos para que não recuem das medidas de isolamento.
Os mais de 40 milhões de brasileiros que vivem na informalidade, os mais de 6 milhões empregados em bares e restaurantes, e outros milhões de trabalhadores do comércio e serviços se já não estão com a renda reduzida, desempregados, ou em profunda insegurança nesse momento, ficarão em breve, e podem estar mais suscetíveis ou desarmados para resistir ao discurso assassino de Bolsonaro e dos empresários que o sustentam.

Negacionismo é a política de Bolsonaro desde o início

Bolsonaro desdenhou do Covid-19 desde que ele ainda chamava-se Coronavírus e parecia uma ameaça distante, localizada na China. Não orientou nenhuma medida de contenção prévia à chegada da pandemia no país quando já era evidente que isso iria acontecer, como a liberação de recursos para a compra de milhões de testes, conforme recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e exemplos como a própria China ou a Coréia do Sul.
Acontece que a declaração de pandemia feita pela OMS em 11 de Março provocou um choque na já combalida economia mundial, com o derretimento das bolsas em todo o mundo, mas com efeito ainda mais violento no Brasil, com dólar a mais de R$ 5 e o Ibovespa com o pior resultado acumulado no ano dentre todas as bolsas de valores no mundo.
Somou-se a isso a expansão dos casos de infecção por Covid-19 confirmados no Brasil ainda em meados de Março, em curva geométrica muito parecida com aquela apresentada em países que já naquele momento estavam em situação mais grave, como Itália, Espanha e França, o que provocou um giro da grande mídia e fez soar o alarme no próprio Ministério da Saúde do governo Bolsonaro e nos governadores dos estados, responsáveis pela gestão local do SUS.
Era inegável que o atraso na implementação do isolamento social na Itália, inevitavelmente acompanhado da redução drástica da atividade econômica, tinha sido responsável pela pane no sistema de saúde daquele país e pela expansão descontrolada das contaminações e mortes, com posterior quarentena forçada de impacto econômico até aqui gigantesco e incalculável. Daí o início das medidas de paralisação das escolas e universidades, num primeiro momento, e em seguida do comércio e grandes aglomerações, por iniciativa principalmente dos estados e municípios.
Vale destacar três elementos dessa guinada na forma como o combate ao Covid-19 passou a ser tratado no Brasil após a declaração da pandemia:
a) essa guinada ocorreu apesar de Bolsonaro, que em nenhum momento recuou seriamente de sua postura negacionista, sempre evidenciando que ele enxergava todas as medidas como exagero, inclusive participando de manifestação no dia 15 mesmo com pessoas do seu círculo íntimo já com infecções confirmadas;
b) tanto o Ministério da Saúde quanto os governadores que se colocaram como antítese de Bolsonaro nunca defenderam verdadeiramente uma política de supressão no combate ao vírus, ou seja, testes em massa e isolamento de todos os suspeitos em quarentena. Até porque, entre o discurso e a prática de figuras notadamente da extrema-direita, como João Dória e Wilson Witzel, há um inegável horizonte de campanha eleitoral antecipada, visando 2022.
Essa linha vacilante dos governadores e do Luiz Henrique Mandetta, ministro da Saúde, que em última instância também é pouco responsável, considerando as limitações do sistema de saúde no Brasil, foi endossada pela grande mídia;
c) era previsível que Bolsonaro não desistiria da disputa para tentar impor a sua política negacionista como linha oficial do governo. O pronunciamento serve a essa disputa, centralizando o discurso de Mandetta, e também para responsabilizar os governadores e a grande mídia pela inevitável recessão econômica provocada pelo isolamento social e quarentena, ainda que parciais.
Bolsonaro nunca negou que o seu projeto político envolvia a morte ou algum outro tipo de eliminação física de seus adversários. Ora afirmando que “a ditadura matou pouco” (sic), ora exaltando o Coronel Ustra, o torturador mais cruel desse período, ora ameaçando “fuzilar a petralhada”, como fez em discurso de campanha no Acre, ou mesmo quando ameaçou “fazer uma limpeza nunca vista na história do Brasil”, e “varrer do mapa esses bandidos vermelhos”.
Infelizmente, no entanto, tais declarações e atitudes não foram suficientes para impedir que ele se transformasse no candidato mais votado da última eleição a presidente no Brasil, contando no segundo turno com o apoio de todos os setores da burguesia brasileira e do mercado financeiro internacional.
Acontece que o pronunciamento de Bolsonaro escancara, mais do que nunca, e devemos atuar para que fique nítido para parcelas do povo trabalhador que apostou em Bolsonaro como alternativa política, que o seu desprezo pela vida não atinge somente os militantes e políticos da esquerda, o que já seria grave o bastante, mas mira também nos idosos e na população do grupo de risco da pandemia, o tio, avô ou a criança com necessidades especiais que todo brasileiro tem na família, particularmente aqueles que mais dependem do serviço público de saúde.
#PararPelaVida

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